domingo, 30 de maio de 2010

A Hippie Dolores

A felicidade era enorme, a gente mal podia acreditar. Nós nos despedimos das noites de fossa, das discussões contra a Madonna, das tardes ouvindo Move On, de tudo triste! Eu arrumei minha mala no mesmo segundo que eu desliguei o telefone.

Eu não sabia o que um roqueiro levava na turnê, então eu peguei todas as minhas calças jeans e todas as minhas camisas de bandas. Não eram muitas, mas qual o problema de feder? Eu era um roqueiro em turnê!
Sapatos? Levei dois, porque eu não via utilidade em mais, um para cada dia, eu ia revezando. Como um bom quase hippie, faltei no barbeiro, deixei meu cabelo e minha barba extremamente compridos para a minha idade.
Para se divertir na viajem eu levei três gibis dos Fabulous Furry Freak Brothers e milhares de discos. Combinei com o Nick que ele levaria o toca discos, porque viajar realmente é um tédio sem música ou gibis.
O nosso primeiro show não era longe, na verdade era possível ir de carro, no caso, de ônibus. O ônibus poderia ser preso por algum tira paranóico por ser tão hippie. Parecia o Magic Bus do The Who.
John apelidou o ônibus de Dolores porque disse que sempre quis ter uma cachorra com esse nome, mas já que sua mãe é alérgica a pelo de cachorro ele nunca teve uma. Então o ônibus servia.
A viajem foi ótima por causa da trilha sonora, e dos meu gibis. A gente também tocava músicas clássicas tipo Smoke on The Water. A conversa era máxima e o motorista, aparentemente chapado, gritava de cinco em cinco minutos:Me fazia sentir tão...hippie.

domingo, 23 de maio de 2010

Maré Baixa

As coisas estavam começando a ficar frias. Nenhuma música nova na rádio, os mesmos posters nas bancas, as fãs não estavam mais tão doidas e a Athena não ligava para a gente para marcar um show a mais ou menos um mês.

Eu realmente achei que aquele era o fim da banda, mas mal sabia eu que a maré abaixa antes da tsunami. Quando eu já tinha até esquecido que fazia parte de uma banda, passava os dias como um verdadeiro vegetal. Não me conformava que tudo tinha acabado tão rápido.
Eu escutava o meu disco tardes inteiras, chorava, e não saia daquela maldita cama. Sempre que o telefone tocava, eu desesperadamente ia atender, com uma mínima esperança de ser a gravadora, mas nunca era. Acabei desistindo.
Eu mal dormia, fiquei revoltado. Joguei minha guitarra nova pela janela, porque vi que aquilo tudo era hipocrisia. Os outros caras também não estavam bem, eles me ligavam direto pra gente se reunir, o que significava ir no bar mais próximo, encher a cara e cantar blues depressivo sobre o mundo capitalista, e como a Madonna estava acabando com o rock.
Sabe, ficar na expectativa é a pior coisa do mundo. Esperar é a pior coisa do mundo. É verdade quando eles dizem que quando você menos espera as coisas boas acontecem, mas isso é uma crueldade, porque até esquecer e parar de esperar por certas coisas, você pode até ter se matado de tanta ansiedade.
Agora quando o telefone tocava, eu não mexia um músculo, nem me importava. Achava que era só uma amiga da minha mãe combinando um jantar para exibir o boletim da filha. Ainda bem que eu comecei a pensar isso.
Quando minha mãe atendia o telefone e gritava:
- Russel, telefone para você, filho.
Eu também não me abalava, pensava que era os caras da banda pedindo pra eu ir em mais uma noite de fossa. Ainda bem que eu também pensava isso. Num dia normal, eu tava deitado na minha cama escutando Move On do Jet, minha música nos momentos depressivos, quando a minha mãe gritou:
- Russel, telefone para você, filho.
- Já falei pra me chamar de Rusty, mãe!
Peguei o telefone, e já adiantei:
- Fala Thom.
- Thom? Não, não. Aqui é o Lucas, da Athena Records, eu descobri vocês num show local, lembra?
- Claro, o que foi?
- Bom, estou ligando para todos da banda só para avisar que vocês podem começar a se preparar, arrumar malas, despedir da família e tudo mais, porque a turnê de vocês começa em uma semana.
- A turnê vai acontecer?
- Ainda tinha dúvidas? Por favor seja breve, não queremos adiar nenhum show.
- Ok.
Eu estava sonhando? Não, eu não estava. Literalmente, a maré abaixa antes de um tsunami.

domingo, 9 de maio de 2010

Negociando com a Athena

Como sempre, eu estava inseguro. É que a Athena Records era uma das maiores gravadoras atuais no mundo, estava lançando um monte de talentos e simplesmente mudar o nosso nome podia estragar muita coisa e eles podiam simplesmente descartar a gente.

E o que a Chloe ia pensar quando todo mundo, menos eu, começasse a chamar ela de onça? Ela podia se demitir, não? E ela sustentava a banda, era a melhor empresária que existia, não perdia uma discussão, se havia críticas negativas ela nos defendia e se uma fã qualquer dizia que estava grávida de um de nós, ela provava o contrário.
Eu não sei se ela ia reagir bem a esse negócio de onça. Eu não queria perder o nosso contrato, eu não queria perder a Chloe e muito menos voltar a tocar em barzinhos. Sabe, a questão nem era o dinheiro. Eu tava sim ganhando um bom dinheiro, troquei a minha modesta guitarra falsa por uma Gibson Les Paul original.
Era legal ser rico, mas se eu perdesse tudo aquilo, não me importava muito. Eu ligava mais era perder a banda. Se a gente fosse dispensado, provavelmente a banda iria se separar, porque sucessos assim, que acabam rápido, nunca mais voltam para o topo das paradas.
Eu não queria perder o perfeccionismo engraçado da Chloe, a tranquilidade até irritante do John, o otimismo simpático do Roger, a visão punk e revoltada do mundo do Thom e o tom reservado mas amigável do Nick.
Também preciso admitir, gostava de tocar para platéias grandes, gostava das fãs me seguindo, gostava de autografar as coisas esquisitas, tipo um gorro de tricô branco e principalmente, gostava de chegar em casa, abrir meu armário, encontrar um poster meu e do lado dele, o meu disco.
Lembra que eu falei que fé me faltava? Não tanto assim. Rezei o caminho inteiro, rezei orações que até achei que não existiam, e os caras só riam de mim. Finalmente chegamos ao prédio filial da Athena Records, subimos até o escritório dos grandes chefes no décimo quinto andar e fomos falar com eles. A onça tava junto, demos a ideia, e eles fizeram uma cara péssima. Depois falaram:
- Tenho ódio de mim por ter lançado vocês...
- O que? Gritou toda a banda
- Tenho ódio por ter lançado vocês como The Next Step! Se fosse So Weird direto teria muito mais sucesso! De qualquer jeito, a turnês So Weird Against Law começa mês que vem. Vamos assinar a papelada?

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Muito Esquisito

Meu Deus, uma banda de sucesso? Eu tava mesmo numa banda de sucesso? Com direito a disco e tudo mais? Não sei se eu tenho baixa auto-estima, mas nunca me considerei um talento nato. Mas talvez eu seja né? Já que gravei um disco como guitarrista solo, devo ter algum talento.

Um dia, eu e os outros caras da banda nos reunimos na casa do Thomas e do Nicholas pra conversar sobre o emblema da banda, novas músicas essas coisas. Tava tudo indo bem até que o Thomas precisou abrir a boca, ainda bem:
- Olha, eu gostava de ser do The Next, era um bom nome, agora The Next Step? Gente isso é maior nome de boy band, né? Tipo, rock gente, isso aqui não é rock! Que tal nossa turnê, que provavelmente vai acontecer, inaugurar nosso novo nome?
Boy band? Nunca tinha pensado nisso sabe, tipo nunca me veio na cabeça que nosso nome era tão boy band.
- Olha eu nunca tinha pensado nisso, mas já que você falou, é verdade. Mas o que a gravadora vai achar disso e que nome você quer colocar? Sugeri
- Aaah, isso é fácil. A gente fala com a onça (era assim que Thomas chamava a Chloe) e vê o que ela acha, aí a gente fala com a gravadora e a nossa nova turnê tá legal, alguém tem alguma ideia?
- Cara, mudar o nome da banda de uma hora pra outra vai ser muito esquisito. Disse Roger, sem a intenção de nomear a banda novamente.
- Isso cara! Muito esquisito! A banda pode chamar So Weird! Eu gostei, o que vocês acham?
Todo mundo concordou, óbvio, So Weird era um nome muito bom. Mas Thomas apareceu com outra ideia, os nossos nomes. Ele queria um apelido irado pra cada um, ok, mas qual? Passamos um bom tempo discutindo isso, mas depois de duas horas, John chegou a uma conclusão:
- Ok gente, aqui estão os apelidos: eu vou continuar sendo o John; Thomas, agora você é o Thom; Nicholas, você é o Nick; Roger, você continua sendo Roger e você muleque, de Russel passa para Rusty. E graças a você Thom, a Chloe agora é...A Onçaaaaaaaaaaaaaaaaa!
Ela não ia gostar nada disso, mas essa era a intenção do Thom. Era meio óbvio que ele gostava dela e é claro que irritar ela seria a melhor maneira de chamar a atenção "da onça". O novo nome da banda era legal e nossos novos nomes também, o único problema era o que a Athena Records ia pensar disso?
Bom, nós só iríamos saber isso no dia seguinte. Combinamos de ir todos juntos e anunciar nossa ideia, e só torcíamos para eles gostarem. Quem sabe isso funciona, ou não? Nunca fui uma pessoa sem fé, mas naquele momento, fé me faltava.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Law Against Me

Juntar todo o trabalho pro disco foi difícil, bem difícil. A gente tinha gravado 15 músicas e o disco podia ter elas, mas se a gente não gostasse de alguma podia tirar, mas o disco precisava de no mínimo 7 músicas.

Qual delas seria a faixa título? Tinha pelo menos umas cinco músicas que poderiam ser hits, e uma delas precisava ser a faixa título. E a capa? Eu não esperava pensar em uma super capa como, sei lá, Houses of the Holy.
E os encartes? As fotos? O nome? Gente como se faz um disco? Eu faço parte de uma banda e nunca pensei nisso. É irritante, muito irritante. Das quinze faixas, duas eram clássicos já, cinco eram hits com certeza, três eram boas, mas não tanto e o resto, preferimos excluir. Não somos o tipo que prefere quantidade do que qualidade, e eu não estou falando de roupas, e sim de músicas.
A capa? Nenhum de nós apareceu na capa. Era um revólver preto ocupando quase toda a tela em primeiro plano e um leve silhueta em segundo plano. Tipo uma arma apontando pra alguém. O nome ficava em vermelho logo em baixo e o nome da banda, em preto do lado.
O nome do disco era Law Against Me, também nome de uma das faixas. O engraçado é que a música nem era pra ser título, a faixa título deveria ser outra mas a gravadora não gostou, achava que era uma letra muito crítica e nos obrigou a mudar. Law Against Me foi escrita no banheiro do hotel por Nicholas.
Bom, o disco foi um sucesso. Meio demorado, mas quando estourou, estourou. Nossas músicas tocavam direto no rádio, fãs paravam a gente na rua para fotos e me perguntavam direto se eu me considerava um jovem talento.
Quando estávamos voltando para nossa cidade, no aeroporto, estavam mais de mil pessoas, aquilo era incrível. Tive medo de ser uma daquelas bandas de rock, que toca nas paradas uma vez e depois nunca mais toca. Isso não aconteceu, ainda bem.
Não demorou muito pra nossa primeira turnê. Vou contar sobre ela depois, agora o avião vai decolar e ler ou escrever durante viagens me da dor de cabeça.

domingo, 2 de maio de 2010

Punk? Nem um Pouco...

Era um sábado de manhã, mais especificamente, oito da manhã. O telefone do nosso quarto do hotel tocou, era Chloe. Pelo amor de Deus Chloe! Nós somos roqueiros de verdade agora, e roqueiros dormem até as duas da tarde no mínimo num sábado!

Bom, pelo menos era uma boa noticia.
- Hey, Nicholas? Anda acorda! Já são oito da manhã! Bom, isso não vem ao caso. Sabe quem acabou de me ligar? O diretor da gravadora, as músicas ficaram ótimas e ele quer vocês lá em uma hora pra decidir o nome do disco e fotografar a capa...Nicholas? ACORDA!
Nicholas esfregou os olhos, desligou o telefone, levantou e gritou. Gritou muito mesmo, aquele era o sonho dele e o irmão. Bom, de todos lá. Só de imaginar que eu tava na banda só por, sei lá, uns dois meses? Mais ou menos isso.
A gente tava indo pra gravadora, Roger e Nicholas foram na frente chamar um taxi, John foi no banheiro e eu e Thomas estávamos esperando ele. Thomas de repente virou pra mim e disse:
- Desculpa cara. Tipo, te julguei muito, te achava só um pirralho. É que tipo, sei lá.
- Tudo bem, não ligo. Não te culpo por isso,na boa, deixa.
Naquela hora, naquele dia percebi que na verdade o Thomas não era um punk insensível e
idiota, na verdade ele se importava com os outros, e tudo. Ele era legal, só tava meio abalado com
o fato da morte do Ben, depois descobri que o Ben era o irmão mais velho dele. Isso deve ter sido
duro pra ele.
Não que agora o Thomas seja meu melhor amigo, mas não tem mais aquele clima ruim de eu
te odeio nem nada. Nem amigos, nem inimigos. Companheiros de banda.

sábado, 1 de maio de 2010

Ligações Inevitáveis

-Oi mãe, tá tudo bem. Não mãe, eu não fumei nada. Ok mãe. Eu juro, não, isso não. Tá, tchau.

Eu não falei nada sobre a minha família né? Minha mãe é uma pediatra totalmente neurótica que mede minha pressão duas vezes por dia, todo dia, desde que eu tinha dez anos. Meu pai é um juiz que nunca para em casa e gosta de música clássica, assim como a minha mãe.
A minha irmã mais nova tem 13 anos e é a maior fã de rock. Eu ensinei ela a tocar várias músicas no violão e dei pra ela a maioria dos meu discos, incluindo o London Calling, esse doeu perder pra ela.
Mas mesmo assim, ela é a minha melhor amiga, na família e fora dela. Eu sinto a falta dela. Toda semana ela me liga e diz que tá escutando o meu disco. Eu também tenho um irmão mais velho, mas ele é muito afastado da gente. Ele fugiu pra Las Vegas pra se casar aos 16 anos e nunca mais voltou.
Algumas semanas atrás ele ligou lá pra casa. Ele tava com 25 anos, e abriu uma loja de roupa. Ainda é casado e a mulher dele é professora. Agora a cidade ele não disse, ele quer liberdade. Nada de família. Não gosto muito dele.
Um dia desses em Londres, o telefone do hotel tocou. Era a minha mãe. Ela me deu o maior sermão sobre maconha, groupies e rock. Ela disse que eu estava indo para o caminho do mal, e Harvard ainda seria melhor. Tarde demais mãe, o disco já estava quase pronto.
Algum tempo depois meu pai também ligou, ele disse que se eu desistisse da banda, ele vinha me buscar onde eu estivesse. Também disse que ele comprou um livro sobre direito. Realmente, acho que eles ainda não perceberam que eu não vou ser promotor.
Minha irmã também ligou, mas a conversa com ela foi mais legal. Ela estava surtando pelo fato de eu ser o guitarrista solo de uma banda de rock verdadeira que estava começando a fazer sucesso. Ela também pediu o autógrafo de todos da banda inclusive o meu, para o caso da gente ficar famosos, e assim ela teria algo de valor.
Sabe, eu sinto falta da minha família, mas aqui com a banda, quando eu estou com eles, até esqueço da minha família. Eu sei que isso parece frio, mas não é. Eu só me sinto a vontade, me sinto livre.