domingo, 23 de maio de 2010

Maré Baixa

As coisas estavam começando a ficar frias. Nenhuma música nova na rádio, os mesmos posters nas bancas, as fãs não estavam mais tão doidas e a Athena não ligava para a gente para marcar um show a mais ou menos um mês.

Eu realmente achei que aquele era o fim da banda, mas mal sabia eu que a maré abaixa antes da tsunami. Quando eu já tinha até esquecido que fazia parte de uma banda, passava os dias como um verdadeiro vegetal. Não me conformava que tudo tinha acabado tão rápido.
Eu escutava o meu disco tardes inteiras, chorava, e não saia daquela maldita cama. Sempre que o telefone tocava, eu desesperadamente ia atender, com uma mínima esperança de ser a gravadora, mas nunca era. Acabei desistindo.
Eu mal dormia, fiquei revoltado. Joguei minha guitarra nova pela janela, porque vi que aquilo tudo era hipocrisia. Os outros caras também não estavam bem, eles me ligavam direto pra gente se reunir, o que significava ir no bar mais próximo, encher a cara e cantar blues depressivo sobre o mundo capitalista, e como a Madonna estava acabando com o rock.
Sabe, ficar na expectativa é a pior coisa do mundo. Esperar é a pior coisa do mundo. É verdade quando eles dizem que quando você menos espera as coisas boas acontecem, mas isso é uma crueldade, porque até esquecer e parar de esperar por certas coisas, você pode até ter se matado de tanta ansiedade.
Agora quando o telefone tocava, eu não mexia um músculo, nem me importava. Achava que era só uma amiga da minha mãe combinando um jantar para exibir o boletim da filha. Ainda bem que eu comecei a pensar isso.
Quando minha mãe atendia o telefone e gritava:
- Russel, telefone para você, filho.
Eu também não me abalava, pensava que era os caras da banda pedindo pra eu ir em mais uma noite de fossa. Ainda bem que eu também pensava isso. Num dia normal, eu tava deitado na minha cama escutando Move On do Jet, minha música nos momentos depressivos, quando a minha mãe gritou:
- Russel, telefone para você, filho.
- Já falei pra me chamar de Rusty, mãe!
Peguei o telefone, e já adiantei:
- Fala Thom.
- Thom? Não, não. Aqui é o Lucas, da Athena Records, eu descobri vocês num show local, lembra?
- Claro, o que foi?
- Bom, estou ligando para todos da banda só para avisar que vocês podem começar a se preparar, arrumar malas, despedir da família e tudo mais, porque a turnê de vocês começa em uma semana.
- A turnê vai acontecer?
- Ainda tinha dúvidas? Por favor seja breve, não queremos adiar nenhum show.
- Ok.
Eu estava sonhando? Não, eu não estava. Literalmente, a maré abaixa antes de um tsunami.